Riso amarelo.

É difícil ser feliz sem fé
Chorar enquanto todos riem
Estar sozinho no meio do nada
Difícil sonhar quando todas as respostas são "não"
Quando não há ninguém para dizer que tudo vai ficar bem
Nadando em lágrimas salgadas, faço do céu estrelado meu cobertor e da Noite meu consolo.


Em branco e preto.

Postais e músicas vanguardistas que contemplam a glória do passado
Versos decassílabos de eruditas palavras e esculturas simétricas de um sangrento apogeu
Tantas são as Artes e tentativas de ser humano, mas nenhuma pode registrar a angústia de meu peito estilhaçado
Não há poeta ou cientista que possa ter provado do fel lânguido de meus lábios
Nem bactéria ou astronauta que saiba do arder de minha dor
Diante de um espelho e falhas palavras ditas aos meus demônios
Minha carne crua disseca ao som de uma única palavra de pútridos sentimentos que escavam covas em minhas entranhas
Sob ecos com sabor de dó, reviro e regurgito o:
passado.

Excerto-enxerto.

Eu nunca vou entender o que eu fiz de errado.
Meus amigos me dizem "você merece coisa melhor", mas eu não me atrevo a dizer isso. Prefiro dizer que mereço...diferente.
Eu fui a melhor pessoa que você já teve, eu só não era a que você precisava.
E eu nunca vou entender.

Estação Saudade.

- Guten Tag!
Sorri.
- Alles Gute?
Acenei que sim.
- Vem cá, me dá um beijo.
Nos beijamos depressa no gramado que recebia as folhas das árvores, era outono.
- Que foi que cê tá meio quietinho hoje, Saukerl?
- Nada. Só tava aqui deitado olhando pra essas folhas e pensando no inverno que tá chegando...a vida é meio assim, né?, respondi.
- Como assim?
- Ah, sei lá. No começo você se interessa pelas coisas com um furor e energia, como se no seu coração fosse verão. Aí chega o outono e você vai vendo tudo perder a cor, cair por terra, perder a vida pra logo chegar o inverno e sepultar tudo numa camada de gelo, congelar tudo que foi bonito um dia.
- Hum...você fala disso de um modo geral?, perguntou.
- É. Um ciclo das coisas, dos sentimentos...
- Do amor?
- Também!
- Do nosso?
Emudeci.
Seu olhou inundou-se de lágrimas que me refletiam não só luz, mas todo um verão.
- Mas cê sabe que logo depois do inverno vem a primavera pra fazer a vida nascer outra vez, pra dar cor e ânimo pra tudo aquilo que tava inerte e que a gente pensava ter morrido, né?
Chorou.
- É, a primavera marca uma nova fase, prepara para um novo verão. Mas nada volta a ser o que era. Nenhum verão é igual ao outro., completei.
- Acabou?
- Acabei.
- Não, nós.
- Eu acho que sim.

Que seus verões sejam lindos e que poucas sejam as mortes dos seus invernos, Saumensch.
Auf wiedersehen. Ich liebe dich. Immer.

Cru.

Hoje senti falta dos teus dentes amarelados do cigarro
Do teu hálito de vinho me falando sobre o trabalho e dos teus dedos tortos prendendo os meus
Senti falta daquela tua camisa amassada e das fronhas cheirando a mofo
Daquela tua falta de fé pela manhã e do teu desconsolo no olhar
Só por hoje eu quis ouvir tuas histórias desinteressantes
Te escrever recados na geladeira e mentir que tudo seria para sempre
Hoje senti tanto sua falta que até me contentaria em fingir que tudo isso algum dia me completou.

Balança.

Para P.H., com dor e amor.

Metade de mim quer ir embora, precisa
A outra amargura na espera que você volte e diga "vamos tentar, eu fiz a coisa errada"
Até que ponto vale a pena esperar?
Se dar?
Desgastar?
O Deus sabe.
Eu disse que não desistiria de nós e esperaria que você descobrisse o mundo
Se descobrisse.
Mas agora não sei o que fazer
Devo fumar outro cigarro?
Tento viver procurando seu conforto em outros braços?
Em outros sonhos?
Outras mentiras?
Novos sorrisos?
Outras camas?
Não sei mais até onde ir
Estou desnorteado, não sei pra onde caminhar
Ou para quem.
No fundo da minha cabeça, no sal de minhas lágrimas, no azedume de minhas noites e nas gotas do meu álcool
Eu sei que não vou desistir
De nós
De você.

Café frio.

É primavera, mas um inverno instalou-se de repente em minha alma.
Tudo acabou. Outra vez.
Derramei uma dúzia de lágrimas, as enxuguei e prometi a mim mesmo que seriam as últimas.
Não vale a pena.
Procurei músicas que me remetiam à você e tentei lembrar de todos os nossos momentos juntos. Chorei um pouco mais, engoli, constatei, amadureci.
Sei que somos duas autoestradas que se cruzaram e agora seguem em direções opostas, mas espero que lá na frente você se lembre de mim e diga a si mesmo que fez a escolha certa.
Porque eu também fiz a minha - e dessa eu não tenho medo de arrependimentos.
Eu vou viver.
Eu nasci para ser do mundo.
Eu nasci para ser meu.

Ressonância.

Teço palavras e construo sonhos ao nosso redor
Sob toques, conectamos nossos corpos como num emaranhado de fios e nos fazemos um só
Seu peito quente recebe gentilmente os toques de meus dedos
Nos fazemos presentes no sentir
Seu hálito, seu cheiro veranil e seus pés roçando nos meus
Cada único átomo de meu corpo vibra ao som de suas palavras
O toque de suas mãos me inunda de um frescor juvenil e de uma ansiedade febril
Torno-me inconsequente quando me tocas a nuca
Faço-me presente no toque e na ausência de vocábulos
E quando nos tornamos uníssonos, incendiamos num arder sufocante
Entre ardores e arderes, torno-me teu e te tornas meu.

Revés.

Eu sou a flor mais linda nascida entre aridez e morte para você pisar.
Aquele momento anterior à chuva, onde o céu brilha seu mais puro laranja antes de virar breu.
Ou, pelo menos, eu era.
Você veio como aquele tiro no peito de uma criança inocente.
Como a mais cruel maré que inunda, destroi e afoga.
Me desfaço perto de você. Todo meu grito, minha lágrima, meu ódio e meu amor parecem inócuos à suas fundações de pedra, às suas raízes viris e seus tormentos que me encantam. É tão fácil me deixar ludibriar por você, como se quando estivéssemos frente a frente eu perdesse minhas cores, você sugasse toda a vitalidade em minha tez.
E cada vez mais eu tenho a certeza de que adoro ser destruído.

Passa.

Tudo passa
O riso acaba
O verme come
O brilho cessa

Tudo acaba
As rugas chegam
As ruas findam
As mães se vão

Tudo morre
A luz se apaga
A mão que afaga
A lágrima confessa

Tudo termina
Os planos adolescentes
Os ardores no peito
Os amores de verão.